Escritos para você

11
Abr 12

O dicionário me diz que cleptomania é  uma doença psicológica, uma compulsão irrestistível que nos faz furtar objetos não valiosos sem necessidade. Não sei qual a sua opinião sobre objetos valiosos, mas normalmente eles são associados ao dinheiro, aos símbolos de poder, a ter acesso a determinados  bens ou a impor a sua vontade, seja pela organização, pela violência ou pela culpa. O que está no mercado é o que há de valioso. Então eu fico por aqui, no meu comportamento errático, simplesmente colhendo almas. Não, meu querido leitor(a), embora possa haver um certo engano, não sou a morte, sequer um Don Juan. Romântico, aquele igualmente sugava almas, mas usando a sedução, o envolvimento. Tudo efemero, contudo, tudo com data marcada para terminar. O mito passa a viver após a morte. 

 

Claro que gostaria de ser um personagem ligado aos poderes do amor, do sexo, com pitadas altas de libertinagem. Infelizmente não é o que ocorre. O tempo, embora não me afete, me devolve potes de amargor e de angústia. Sou um migrante. Sinto, menos por vaidade e mais por conveniência, não ser mais atraente. Afinal, a beleza é um ingrediente que me aproximaria mais de minhas vítimas. Nesses dias, ser belo é um distintivo social, um facilitador em um mundo narcisista. A atração, o desejo torna as almas mais dóceis, mais influenciáveis, menos resistentes. Aprendi que o melhor é lidar com pessoas apaixonadas, em depressão, com alto sentimento de culpa, com tristezas infindáveis, com aqueles que vagam em desespero, enfim, com todos que, consciente ou inconscientemente não suportam mais viver. Tomo-lhes as almas como quem sorve um cálice de néctar. Ou de sangue. Facil e rapidamente.

 

Minhas súditas almas me comprazem, me servem, resgatam a minha autoridade e senhoria. São elas o meu grupo, a minha coesão, o meu exército indizível, a minha legião.  Mesmo assim, há aquelas que, para serem tomadas, necessitam que mais eu me concentre; para as mesmas me reservo mais ardiloso, subreptício, esperto,  perturbador. Insuflo sonhos de potência, situações confusas, aflições, temores, sentimentos de culpa infundados. E aguardo. Se não as consigo converter ajo como um ladrão experiente;  se não posso furtar algo aqui, mais adiante terei minha recompensa. A psicologia dos estudiosos me diz cleptomaníaco. São estranhas as ciências e as sabedorias dos homens, que não reconhecem as forças mais vitais da sua psiquê. Personagens, simplesmente tateiam: descobrem um infortúnio e mais adiante uma invenção.

 

Miram objetivos tão distantes, sabendo de antemão que não poderão sequer alcançar suas portas; de todo modo, são poucos os que são coerentes, e que se reconhecem dentro de suas fraquezas e limitações. A cada dia mais os sentidos e as conveniências se esgotam, mas eles persistem, muitos já sem alma, sem qualquer outra coisa a fazer senão desistir completamente de tudo que os cerca. Quando alguém renuncia ao que é, abandona a  sua própria humanidade ou opta pelo desespero, me sinto convidado.  Rastreio suas vidas com a experiência de um perito, e quanto mais aprendo sobre elas, mais as enveneno. Sem dúvida, voltarei depois de um tempo razoável, e as suas almas já estarão clamando pela minha presença.

 

Tolos, pensam que os libertarei. 

publicado por blogdobesnos às 18:46

Convoque-se, então, deste reinado, somente aqueles que conduzem a honra e a decência na lapela e no bigode e que portem, sombranceiros, as idéias que promovem o homem, as culturas, as etnias, o progresso e o convívio fraterno e respeitoso.

Chame-se, então, deste reinado, somente aqueles que, educadores, se proponham a educar; estudantes, que se dediquem a aprender, cientistas, que estejam dispostos a pesquisar, farmacêuticos, que busquem conhecer as floras e as faunas, políticos que queiram lutar pelas causas do povo, alquimistas que procurem químicas para e pela vida.

 

Tragam-me, então, deste reinado, aqueles que, trabalhadores, se disponham a produzir, artistas que sejam criativos, filósofos que indiquem caminhos e alternativas, mães e pais que se responsabilizem e amem verdadeiramente seus filhos, pessoas que tragam em si a essência da solidariedade, governantes que estejam dispostos a ver no povo mais do que uma massa de eleitores, bibliotecários que amem a leitura, religiosos que entendam que a religião liberta e não aprisiona.

 

Busque-se então, deste reinado, somente aqueles que, amantes, amem, construtores que construam com segurança e conforto, financistas que não se percam no labirinto do lucro fácil, médicos que se ocupem em salvar vidas e minorar as dores, perfumistas que busquem as essências da flora, donas de casa que se orgulhem de sua família, avós e avôs que passeiem em segurança pelos parques, pelas ruas e pelas avenidas, amantes que pensem antes em dar do que receber.

 

E, por fim, a todos os que foram tocados pela corrupção, pela desídia, pela inveja insustentável, pela ganância irresponsável, pela ignorância e pela estupidez, pela perseguição política e religiosa, pelo arrivismo social, pela marcha para a guerra, pela construção de castas, pela ignomínia e pelo abastardamento de sua alma, a esses todos, que chamaremos de repulsivos que partam com seus filhos imediatamente para longe destas fronteiras e que seus bens sejam avaliados e que lhes sejam entregues os valores justos pelos mesmos, para que partam sem que, aqui, nada reste de sua presença, de suas coisas, de seus desejos, de suas infelicidades.

 

Cumpra-se ( o mais rápido que o vento possa levar).

publicado por blogdobesnos às 15:22

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